terça-feira

Ainda Te Escrevo

É isso mesmo, ainda te escrevo e sei que ainda lês, sei que ainda observas daí de cima o que se vai passando cá por baixo, na verdade, ainda te escrevo porque sei que me ouves, que me entendes e que ajudas, nada muda o facto de tudo ter sido prematuro, doloroso e muito desgastante mas a história da minha vida é mesmo esta e com ela que tenho que caminhar para a próxima etapa.
A frase que tenho nas costas "So tell that someone what you are thinking of, if tomorrow never comes", retrata na perfeição todo este sofrimento, eu não tive tempo para dizer o quanto te amava, o quanto o meu equilíbrio dependia das tuas pernas, como o meu chão era plano com o teu deslize, como os meus olhos admiravam os teus caracóis, infelizmente todo esse tempo me foi roubado, o tapete foi me tirado do chão e eu tive que lidar com os danos que a queda me proporcionou, tive que crescer cedo demais e em parte a culpa é tua, mimavas-me muito, ficar aos pés da minha cama até adormecer, pequeno almoço feito, e computador novo quando critiquei aquele velho que nos haviam oferecido, fazendo uma retrospectiva, eu não vivia, eu sonhava, porque a minha vida não passava de isso mesmo, um sonho e quando te levaram foi como se me acordassem de um sono profundo 12 anos mais tarde e dissessem "agora desenmerda-te".
Nunca me chegaste a ver com barba, é chato sabes, ter que desfazê-la porque o patrão não gosta ou porque a namorada diz que pica, também não me viste a fazer a depilação com cera quente, ias achas que tenho algum complexo com pelos, mas não, apenas gosto das pernas "limpas", gostava que visses a maneira como cresci, o que hoje em dia tenho, corri atrás de tudo e ainda corro, consegui uma casa, um carro e um emprego do qual me posso orgulhar, hoje sou eu que escolho o computador que quero comprar ou o que quero vestir, tenho saudades da roupa da La redoute que mandavas vir para mim, de alguma maneira era engraçado ver roupa a chegar pelo correio.
Queria que conhecesses o meu cão, o Bugs, é terrível, rata tudo o que encontra e ainda me assalta o caixote, que peste! Desejava poder passear contigo mais uma vez, como fazíamos pelo jardim da parada depois de um almoço na casa da minha avó, lembraste? Claro que te lembras, és como eu, nunca te esqueces dos bons momentos.
Mas na verdade desta redundância toda, ainda te escrevo porque por vezes sinto necessidade de falar contigo, dizer-te o que me vai na alma e esperar um conselho teu, como quando eu estudava e tu me disseste o que fazer quando apanhaste aquele bilhete que dizia "queres namorar comigo? sim ou não", conselhos que valiam ouro e o meu ar envergonhado dizia tudo. Tenho a certeza que não me ensinaste tudo o que me podias ensinar, sinto saudades daquele empadão, daqueles pasteis de bacalhau, sinto saudades tuas, saudades nossas, há uma música, do Luan Santana que me faz sempre lembrar de ti, chamada "Te vivo" e eu ainda te vivo e de que maneira! Podia me ter tornado num revoltado, podia ter seguido por maus caminhos, mas mantive-me rijo, seguindo as tuas regras, "nunca pegues num cigarro", "nunca aceites nada de ninguém", "ouve os mais velhos" e hoje estou aqui e alguns desses conselhos ainda ecoam na minha cabeça, e o pseudónimo que usavas para me tratar, "piolho", o teu piolho, nunca me esquecerei disso, só queria mais uma oportunidade como tantas tive nos meus sonhos, para desta ver não deixar nada por dizer, mas como isso nunca vai acontecer, vou te escrevendo...

quinta-feira

Daemons

Todos nós possuímos "Deamons", há sempre algo que nos atormenta mas que ninguém sabe.
Para quem não sabe, Deamon é um termo técnico informático, que serve para um programa que corre de fundo no nosso computador sem precisar de um usuário para o iniciar, corre simplesmente, independentemente daquilo que possa causar, eliminando estas explicações todas, termos e tudo mais,
a verdade é que, nós temos Deamons.. onde? No nosso subconsciente.


Aquela voz de fundo que ouvimos, que questionamos, que nos diz que não somos capazes, aliada aquela má recordação onde vacilámos no trabalho, onde reprovámos no exame de condução, mesmo após termos sucesso, torna-se num Deamon, a partir daí sempre que estivermos em situação em que não sabemos como decidir, esse Deamon, ainda que ultrapassado, vai retornar, moer-nos a cabeça e fazer-nos acreditar que não é possível.
Eu tenho bastantes e as vezes torna-se psicótico, tanta coisa para processar, tantos "bugs" que tive durante o meu crescimento, o olhar para quem fui e para quem sou, a eterna questão, "Sabes o que vais estar a fazer daqui a 5 anos?" e a outra "Há 5 anos imaginavas-te assim?", já pensaram nisso? Já olharam para trás e imaginavam que hoje iam ser quem são, ou já olharam para a frente e acreditam que daqui em diante serão assim? A sociedade muda-nos a todos, incute-nos o sentimento de necessidade, o consumismo, o materialismo e todos estes "ismos" que hoje não conseguimos viver sem. Tento abstrair-me disso, tento manter-me fiel a pessoa que sempre fui, mas as vezes é complicado, em momentos de indecisão, esses Deamons voltam e mudam a nossa maneira de pensar como um simples click num interruptor desgastado.
Será que alguma vez nos veremos livres deles? Existirá a cura para estes Deamons? Para este backup que é o nosso sistema cognitivo? Eu não sei, só sei que hoje vou ter de lutar contra eles novamente.